Governo Bolsonaro, não Lula, pediu devolução de verba usada para custear remédio para doença rara

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  • Publicado em 21 de junho de 2023 às 21:47
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  • Por AFP Brasil
Em novembro de 2020, o jornal Fala Brasil noticiou que o governo estava pedindo que a família de Kyara Lis, diagnosticada com uma doença rara, devolvesse R$ 6,5 milhões, liberados para a compra de um remédio para a criança. Em publicações com centenas de compartilhamentos nas redes sociais desde 17 de junho, usuários associam a notícia ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Na verdade, o valor foi liberado por decisão judicial, mas a União recorreu, durante o mandato de Jair Bolsonaro, alegando que o Sistema Único de Saúde (SUS) já disponibilizava outro medicamento para a doença.

“Governo quer de volta 6,5 milhões que liberou para família comprar um remédio. Faz o ‘L’”, diz a legenda de um vídeo que circula no Facebook, no Instagram, no Kwai, no TikTok, no Twitter e no Telegram, fazendo referência ao sinal usado por apoiadores de Lula.

A sequência mostra um trecho do programa Fala Brasil, da TV Record, noticiando que o governo solicitou que a família de Kyara Lis, uma criança que sofre de uma doença degenerativa rara, devolva o dinheiro liberado, por decisão judicial, para o tratamento da menina.

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Captura de tela feita em 20 de junho de 2023 de uma publicação no Twitter ( .)

A notícia, contudo, não se refere ao governo Lula, e sim ao governo de Jair Bolsonaro (PL).

Por meio de uma busca pelas palavras “Fala Brasil”, “doença rara” e “6,5 milhões”, o AFP Checamos localizou o trecho original, exibido em 27 de novembro de 2020.

Entenda o caso

Em junho de 2020, a família de Kyara iniciou uma campanha de financiamento para conseguir comprar um medicamento para o tratamento da criança, diagnosticada com Atrofia Muscular Espinhal (AME) Tipo II, doença que compromete os neurônios motores.

Na época, foi informado que o Zolgensma custava US$ 2,1 milhões (cerca de R$ 12 milhões) e não estava disponível no SUS. O medicamento foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em agosto de 2020, mas incorporado ao (SUS) apenas em dezembro de 2022.

Em agosto de 2020, a mãe contou ao g1 que a família acionou a Justiça para conseguir auxílio do Ministério da Saúde, mas que ainda esperava o julgamento do caso.

No mês seguinte, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que o Ministério da Saúde informasse aos pais de Kyara se iria disponibilizar o medicamento. Porém, a família afirmou que a União havia se negado a subsidiar o remédio.

Com a campanha virtual, a família havia arrecadado R$ 5.340.981,14 até o início de outubro. O STJ, então, determinou que a União repassasse R$ 6.659.018,86 para a completar o valor do remédio.

Em 21 de outubro de 2020, os pais anunciaram em sua conta no Instagram que haviam recebido da União com o valor que faltava.

Entretanto, a Advocacia-Geral da União (AGU) recorreu no STJ em novembro pedindo que a família devolvesse o dinheiro. Na época, a defesa da União argumentou que o SUS já fornece outro medicamento, o Nusinersena (Spinraza).

A AGU também alegava que a oferta do Zolgensma traria impacto orçamentário aos cofres públicos, já que, segundo cálculos da União, seriam necessários R$ 4,9 bilhões para atender a 450 crianças no primeiro ano de tratamento.

Em dezembro, o Ministério Público Federal (MPF) enviou uma manifestação ao STJ em que alegava que não havia evidência de que o Zolgensma pudesse oferecer mais benefícios do que o medicamento já disponível no SUS.

Após a manifestação do MPF, o portal Metrópoles noticiou que os pais devolveram à União cerca de R$ 4 milhões, mas que estavam impedidos de falar sobre isso por conta de uma cláusula de confidencialidade. Segundo a matéria, o montante corresponde à sobra da compra, isso porque a farmacêutica dona da patente diminui o valor da aquisição à vista.

Em julho de 2021, a mãe de Kyara disse ao g1 que a menina conseguiu dar os primeiros passos e que o medicamento impediu a atrofia dos neurônios motores responsáveis pela respiração.

Referências

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